QUEM AMA CUIDA. QUEM CUIDA AMA

14/10/2011 00:10

 

A CENA

Os fatos se repetem: brigas, armas, socos, ponta pés, tiros, drogas, medo, terror, assassinatos. Não pense que estou me referindo a uma favela, boca de fumo, presídio, estádio de futebol ou a uma final de determinada festa em alta madrugada. Estou falando de escola. Escola? Isso mesmo.

 

Então vamos aos fatos. Abril de 2011, em Realengo, no Rio de Janeiro, um ex-aluno disparou matando doze crianças e adolescentes, na escola onde dissera ter sofrido humilhações. Poucos meses se passaram e, entre tantas notícias de violência na escola, uma ganhou a mídia no dia 22 de setembro, pelo seu caráter inusitado: com apenas 10 anos de idade um garoto chamado David, em São Caetano do Sul, São Paulo, com a arma do pai, atira na professora e depois se mata.

 

Algumas pistas em torno dos fatos nos apontam algo que vai além da própria tragédia. “Eu vou vingar todos os que me humilharam ao longo desses anos”, deixou escrito e também gravado em vídeo o jovem de Realengo. “Ele me disse que não gostava da professora”, confidenciou um dos colegas de David. “Ele acordou e me perguntou se eu ficaria triste se ele morresse”, contou o irmão de David para a delegada. “A tragédia de São Caetano é um exemplo radical da deterioração da relação entre professores e alunos”, afirmam os estudiosos. “As crianças não estão sendo educadas pelos pais para suportar a contrariedade e a discordância nem a respeitar aquele que tem mais saber e autoridade que é o professor”, afirma a neuropedagoga Irene Maluf, com quem concordam tantos outros especialistas da neurociência.

 

O CENÁRIO

Se você está atento às notícias de televisão deve estar percebendo o que está se passando com a infância e a adolescência no Brasil no que se refere à violência. Os dados estatísticos do governo mostram que nos lares e nas ruas cresceu a violência com altas taxas de assassinatos de crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos.

 

Se aqui eles são vítimas, na escola estão se tornando réus. Não bastasse o bullying, (ato de constrangimento que causa no outro feridas físicas e psicológicas que, quando não cicatrizadas, podem despertar o ódio na pessoa agredia, gerando mais violência pela vingança) as constantes brigas entre grupos de alunos combinadas pela internet, as agressões que levam milhares de professores ao afastamento de suas funções por causa do medo, da depressão e de outras doenças psicossomáticas, são apenas um sinal da violência levada as últimas consequências que tem resultado em mortes dentro das escolas.

 

A instância segura de formar cidadãos tornou-se um lugar tão perigoso quanto a rua, nos últimos tempos. Dizer que isso não acontece só no Brasil, não diminui a gravidade dos fatos, muito menos exime a sociedade brasileira de suas responsabilidades. Ao mesmo tempo obriga-nos a uma reflexão que talvez gere mais perguntas que respostas. Numa dimensão familiar, por exemplo, qual é a responsabilidade dos pais na educação de um filho? A educação é responsabilidade do Estado, diz a carta Magna. Mas que educação? A acadêmica sim. Mas a educação da pessoa, sua personalidade, seus princípios humanos, suas escolhas religiosas, suas bases para a convivência social, sua capacidade de partilhar superando o egoísmo e o egocentrismo, sua capacidade de lidar com privações e frustrações? Também essa está na responsabilidade do Estado através da escola? Não posso crer.

 

Do contrário, o problema que está se instalando exatamente por causa dessa transferência de responsabilidade se agravará tornando-se um caos incorrigível. Inverteram-se os papeis. Embora no mundo atual os pais tenham se tornado mais escravos e subordinados dos filhos, trabalhando a vida toda apenas para lhes assegurarem os bens materiais, o Estado com suas intermináveis e questionáveis leis tirou a autoridade dos pais.

 

Não estou defendendo violência doméstica de pais que espancam filhos. Mas também não tenho medo de dizer que a prática me mostra que filho que não chora em casa chora na rua; filho que nunca escuta a palavra não em casa é ‘barrado na rua’; filhos valentes em casa tiveram seus corpos recolhidos pelos seus pais porque o mundo impôs um cruel limite. Lamentável dizer isso, porque se não os temos, amamos os filhos dos outros e convivemos com eles. Somos todos responsáveis por todos, se dentro de nós pulsa um coração humano e não um coração de pedra. Mas a sociedade moderna trilhou caminhos inesperados, surpreendentes. Escolheu uma direção a qual, muitas vezes, não sabemos aonde está nos levando. E se há alguém ou alguma instituição que está pagando por isso ela se chama família. Ao lado dela também a igreja e a escola.

 

A mais frequente reclamação que ouvimos dos pais é a de não saberem mais como educar seus filhos. Por isso transferem responsabilidades. Não há mais ‘porto seguro’ para ninguém. As três instituições citadas estão reféns de uma sociedade relativista em seus valores. Não se pode impor nenhuma norma ao cidadão e há uma supervalorização da pessoa menor de idade.

 

O Estado classifica os cidadãos de até 18 anos como menores e alguns pais ainda os chamam de crianças. Não se esqueçam que psicologicamente são capazes de decidir por uma sociedade do bem ou da transgressão. Vejam que milhares de jovens nesse período tomam decisões super acertadas e levam a vida com respeito trabalhando e estudando. Outros são capazes de decidir pela criminalidade e afirmam saberem o que estão fazendo. No plano biológico sabem escolher seus parceiros e já são capazes de procriar.

 

Socialmente querem ser livres para fazerem suas escolhas para a diversão e para aquilo que lhes traga prazer ou aprovação nos seus grupos de convivência. Na família confrontam sua autoridade com a dos pais. Poucos se referem aos pais e avós como senhor, mas sim como você. Não se toma a bênção dos pais, mas se diz tchau. Parece pouco ou apenas uma questão de linguagem, mas não é. Parece-me que desapareceu o estagio psicológico da inocência. Essa palavra não me parece mais em moda.

 

E a infância? Esta palavra que significa a fase da vida em que a pessoa ainda não fala ficou no passado. Os filhos pequenos são vestidos e maquiados como adultos. Tudo ficou precoce. Os instintos sexuais são estimulados, mas não acompanham a estrutura física.  Saímos de um extremo e caímos em outro: no passado uma educação castradora proibia as crianças de tudo. Em assunto de adulto criança não entrava. Hoje há um excesso de autonomia em que as crianças manifestam um exagerado saber não compatível com sua idade cronológica. Conhecimentos desprovidos de maturidade e sabedoria, pois ainda não lhes pode exigir tudo isso. Um excesso de informação e uma pobreza de formação.

 

Estamos no tempo da busca de uma felicidade conceituada como algo fruto da livre escolha pessoal em que o sujeito escolhe aquilo que lhe dá prazer mesmo que seja a custa do sofrimento do outro. Vale e é legítimo aquilo que faz a pessoa feliz. Cada um é livre e dono do seu corpo e da sua vida. Faz o que bem quiser e todos têm que respeitar. Daí surgem implicações concretas que modificam todo o cenário no qual se forma uma criança. Na família o pai é juridicamente obrigado a tudo, mas não pode nem falar mais forte com seu filho porque vai causar traumas e o pai será punido; os pais não devem acompanhar o que os filhos acessam na internet porque se trata da privação da liberdade; na escola não pode haver punição, nem câmeras, nem revista nas mochilas porque é constrangimento; a formação religiosa fica para mais tarde para o filho escolher em qual igreja vai se sentir melhor quando crescer porque aí ele já é livre, enfim... Sinceramente se eu disser o que penso sobre tudo isso posso causar incômodos. Por isso prefiro o caminho que muitos escolheram e deu certo: o amor.

                     GOTAS DE AMOR

Adote seu filho mesmo antes de ele vir ao mundo.

Chore com o seu filho quando ele chorar de verdade.

Alegre-se com o seu filho quando ele comemorar uma vitória.

Pare tudo e escute seu filho quando ele chamar.

Observe o sorriso do seu filho.

Dê importância às lagrimas do seu filho.

Preocupe-se quando seu filho estiver calado num canto e isolado.

Ouça seu filho quando ele falar de seus medos, sonhos e fantasias.

Veja televisão com seu filho e partilhe com ele assuntos importantes ou difíceis.

Mostre ao seu filho que temer o perigo não é sinal de fraqueza.

Ensine ao seu filho que não basta ter coragem, é preciso ter fé.

Testemunhe para seu filho que Deus sem ele é Deus, mas ele sem Deus é nada.

Leve Seu filho a Igreja para que não tenha que tirá-lo da cadeia

Role com seu filho no chão, jogue bola, corra, ande de bicicleta, gaste um tempão com ele e você terá um amigo para sempre.

Nunca diga ao seu filho que homem não chora e que mulher é sexo frágil.

Mostre ao seu filho que não importa a fraqueza da queda, mas sim a força do levantar-se.

Lave louça com seu filho e diga que ele pode fazê-lo sem constrangimento enquanto a irmãzinha brinca de boneca.

Manifeste respeito para com todos na frente do seu filho, para nunca ter que corrigi-lo por atitudes de racismo e discriminação.

Demonstre para seu filho que você também se cansa, erra, acerta e um dia vai morrer.

Explique para seu filho que um dia ele também terá responsabilidades de adulto.

Adote seu filho com toda sua vida para que outros não o adotem.

Ame seu filho com tal intensidade de modo que ele entenda que o amor é a medida de todas as coisas e a fonte das decisões mais sublimes que podem realizar plenamente o ser humano.

 

Pe. Francisco Guerra

Vigário Geral da Diocese de Itabira - MG